26 fevereiro 2012

Factory Girl, George Hickenlooper (2006)





Andy Warhol: I wonder if people are going to remember us? 
Edie Sedgwick: What, when we're dead? 
Andy Warhol: Yeah. 
Edie Sedgwick: Well I think people will talk about how you changed the world. 
Andy Warhol: I wonder what they'll say about you... in your obituary. I like that word. 
Edie Sedgwick: Nothing nice, I don't think. 
Andy Warhol: No no, come on. They'd say, "Edith Minturn Sedgwick: beautiful artist and actress... 
Edie Sedgwick: ...and all around loon. 
Andy Warhol: ...Remembered for setting the world on fire... 
Edie Sedgwick: ...and escaping the clutches of her terrifying family... 
Andy Warhol: ...Made friends with eeeeverybody, and anybody... 
Edie Sedgwick: ...creating chaos and uproar wherever she went. Divorced as many times as she married, she leaves only good wishes behind. 
[laughs
Edie Sedgwick: That's nice, isn't it? 
VII.
O equilíbrio. O desequilíbrio. O apesar de. O amor. São estas as palavras que ecoam dentro da sua cabeça, como uma música que ficou na memória dos tempos de infância. Faz um jogo de paciência. Quantas vezes por minuto pensa nela. Uma, duas, três, quatro, perde a conta à trigésima primeira vez.
Lembra-se de um dia no jardim, que se sentaram na relva. Namoraram na relva. Conversaram na relva. Foram felizes na relva. O cheiro dela colado ao cheiro dela, o cheiro dela por cima do cheiro dela, por baixo dela, por cima dela, por tudo o lado. Em todo o lado. Agarrado, impregnado, colado, sempre, para sempre. Também ele como uma musica que ficou na memoria dos tempos de infância.
Sente-se fraca nos dias em que estas memórias a assaltam. Sente que quer voltar. Há dias em que a força para fugir é tão pouca, é também ela fraca. Sente que não pode voltar. Debate-se durante alguns minutos. Acende um cigarro. As palavras continuam a ecoar na sua cabeça, vêm com cada batida do coração, querendo saltar quase do peito para fora. Apaga o cigarro. Hoje não irá dormir novamente.

23 fevereiro 2012

Ela é um praga.
Sofre,
e faz sofrer.










Polaróides de Pedro Paixão
Não se sabe como acontece. Digo o desejo que tudo arrasta, tudo envolve num aperto de asfixia. A vontade de anular todo o intervalo entre as coisas no ardor dos corpos, no misturar das línguas.

Pedro Paixão
Antes de abrir os olhos tenta avaliar o seu estado de alma. Não é fácil encontrar o adjectivo. Fica quieta. Se se mover teme que o adjectivo seja outro. Poderá passar de triste para desesperada. Poderá oscilar entre o ansioso e o angustiado. Mas nunca se metamorfoseará de qualquer coisa próxima da infelicidade para qualquer coisa próxima da felicidade. É pelo menos essa a sua convicção. Os adjectivos da alma têm uma lógica própria que deve ser respeitada. Ou então não têm lógica alguma. E há adjectivos de que gosta muito mas não saber aplicar: pesaroso, amargurado, lânguido. Não conhece a lógica deles.

Pedro Paixão em, Rosa Vermelha em Quarto Escuro

19 fevereiro 2012

O que era preciso era continuar. Continuar a mentir o mais perfeitamente, sem qualquer deslize, usando todos os recursos da imaginação, mas agora sem o antigo prazer de derrotar a realidade, antes uma angústia cada vez maior a crescer-lhe no peito, o que o obrigava a procurar a alívio nos químicos que minuciosamente doseava, porque nada devia transparecer na sua cara que o pudesse trair. Era preciso mentir sobre a mentira e continuar. Sentia-se esgotado, mas a paixão fazia-o continuar. Se não há uma verdadeira vida também não pode haver uma verdadeira morte. Se calhar teria sempre de continuar. Este pesadelo fê-lo estremecer e abrir os olhos que julgava abertos. Escurecera. Procurou o interruptor do candeeiro e uma luz azulada encheu o quarto. Que horas seriam? Ela não devia tardar.


Pedro Paixão em Aflição

18 fevereiro 2012

Lembro de sentir um medo enorme. Vou, não vou? Lembro da mistura de ansiedade com algum sentimento sem nome ou explicação. Eu sabia e não sabia. Não sabia e tinha medo de descobrir. Lembro de sentir um frio na barriga, de pensar em desistir, de tomar Smirnoff Ice e dois chopps. Lembro de cuidar a hora, de sentir o atraso andar rapidamente e de achar uma pequena brecha, desculpa ou seja lá o que for pra ir embora. Lembro de sorrir de vergonha, de não saber o que fazer com as mãos, de falar daqueles 15 minutos intermináveis e deixar claro que eu ia, sim, embora. Lembro de tudo isso desaparecer no momento em que olhei no fundo do teu olho. Lembro de ter perguntado se teus olhos eram verdes, a sala ficando escura. Lembro de agarrar forte a bolsa, da luz apagar completamente, da gente ir conversando mais perto, sentindo o calor um do outro. Eu lembro de muitas sensações que me amordaçavam e embaralhavam docemente o meu estômago. Lembro de sentir uma mão na minha, de um carinho bom e de um quê de segurança. Lembro de chegar perto, de ouvir teu coração. Lembro de, a partir daí, esquecer de lembrar de alguma coisa. Lembro da tua boca suave, da tua língua quente, da tua pele com cheiro bom, do teu beijo na testa, do nosso abraço. Lembro de ficarmos abraçados, como se aquele momento fosse virar eternidade. Um pré-roteiro, uma pré-história. Fixação de um sentimento. Eu lembro.


Lembro da mensagem que eu recebi, da sequência absurdamente deliciosa de e-mails, das euforias tranquilas dos primeiros encontros. Do pedido de namoro, dos primeiros segredos e confissões. Eu lembro de sentir medo, lembro de pensar em desistir. Lembro de saber que eu nunca mais seria a mesma, que a minha vida mudaria, que eu reencontraria parte de mim e me apresentaria a uma Clarissa nova ou velha, quem sabe? Lembro de conhecer o significado do amor, do sexo, da vida, do encanto. Porque amar é se encantar com pequenas coisas, coisas pequenas que se juntam e ficam compridas.


Lembro de relaxar, de seguir um conselho sábio e me atirar do precipício. Lembro de ter um homem cheiroso e barbudo, com um abraço que é casa e com um olhar que faz tudo de ruim desaparecer, estar lá embaixo me esperando, só pra me segurar com braços acolhedores. Lembro de sentir uma dor estranha por achar que tudo, um dia, pudesse desaparecer. Lembro de um eu te amo que ouvi, numa manhã, ao acordar. Foi e vai ser sempre o eu te amo mais bonito que já saiu da tua boca. Lembro da tua boca bonita dizendo pra eu não sentir medo, pra confiar no teu sentimento. Lembro de tentarem fazer com que eu atirasse o nosso amor bonito pelo ralo.


Eu lembro, amor. De tudo, cada passo que a gente deu para as diversas direções que já fomos. Lembro das brigas também. Lembro de pensar que o amor é perfeito, que bobeira, o amor é pura imperfeição. Perfeitos só os casais do comercial da Becel (sem sal), te disse isso ontem enquanto estávamos deitados, com os olhos vermelhos de chorar por um desentendimento bobo. A maioria deles foram bobos, parte deles virou piada. Lembro da gente não deixar o silêncio e o mal resolvido virarem mágoas e rancores. Lembro de esquecer tudo com um abraço. Lembro de uma vez te dizer pra pensar em como seria a vida sem mim. Lembro de ter ouvido que a situação foi pensada. Lembro disso ter me doído, porque essas coisas machucam fundo a gente. Lembro de ter me arrependido de coisas que eu disse, lembro de pedir desculpas, lembro que algumas coisas a gente não esquece, amor.


Lembro de já ter ficado triste por te deixar triste. Lembro de me sentir mal com isso. Lembro dos momentos em que a gente foi bobo e feliz. Lembro que sou feliz a maior parte do tempo, pelo simples fato de você existir em mim. Lembro de descobrir que um sentimento não serve para ser dito, como coisa que fica bem em filme ou texto, ele tem que ser vivido de forma plena. Lembro de não conseguir me permitir sentir tanta felicidade assim. Lembro da tua mão, que sempre acha a minha. Lembro dos teus dedos, que sempre me fazem carinho. Lembro da tua boca, que sempre me acalma. Lembro do teu rosto de menino, que me olha como se ainda fosse aquela primeira vez. Lembro de cada coisa que descubro, manias, gestos, pensamentos.


Lembro dos nossos planos, conversas em tardes ou noites, sonhando com algo que a gente batizou de Futuro. Lembro que os quadrinhos da Coca são teus e que eu vou comprar a televisão. E, eu sei, ela tem que ser e-nor-me. Lembro do nosso manjericão dodói e dos nossos filhos verdemente apeluciados. Lembro do nosso plano de um dia ter um cantinho, uma casinha pra chamar de nossa. Lembro dos nossos projetos de viajar, conhecer lugares, aproveitar cada canto do mundo. Lembro que um dia o Oscar vai chegar pra encher a nossa vida de lambidas e pelos. Lembro que um dia um bebê branquinho, loirinho e de olhos claros, lindos como os teus, vai chorar no meio da noite e um de nós vai ter que levantar. De todas as realidades por mim sonhadas, você é a melhor. De todos os meus sonhos, você é o mais real. Eu poderia passar 23 eternidades te vendo dormir, de tão bonito que você dorme. Aprendo com você todos os dias, sei que ainda existe muito mais. E toda a vez que eu olho fundo no teu olho, eu penso nossa, eu amo esse homem, é com ele que eu quero passar o resto da minha vida. Quero que ela seja longa, muito longa, só pra poder ficar mais tempo ao teu lado.



Clarissa Corrêa, Lembranças

16 fevereiro 2012

14 fevereiro 2012

Há dia, sabes, em que gostava de ser como o gato e que me tocasses sem desejar encontrar quaisquer sentimentos a não ser o que se exprime num espreguiçar muito lento - um vago agradecimento? - e que depois me deixasses deitado no sofá sem que nada pudesses levar da minha alma, pois nem saberias o que dela roubar. 




Pedro Paixão em, Assinar a pele (conto)